quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Peter: 1


Nova York - 1962 
- Viu o noticiário?
- Quem é você?
Paul olhou-o desconfiado: 
- Está dormindo ainda? Não reconhece seu irmão, porra? - Paul disse sentando-se ao lado de Peter no sofá velho, de fronte para a televisão onde passava uma reprise de I Love Lucy.
Peter esfregou os olhos meio atordoado tentando lembrar o que fizera na noite passada:
- Bem, o que aconteceu de tão importante?
- Sabe o vizinho do começo da rua? O Smith?
- Sei...O que ele fez? - Indagou Peter vestindo seu sobretudo.
- Passou no noticiário.. a casa deles foi invadida... mataram o coitado.. dezessete tiros, acredita? Mataram a mulher dele e a empregada também.
Nossa! Bem, ele sempre me pareceu um pouco esquisito, porem não imagino que tivesse algum motivo para ser morto dessa maneira. - Peter pegou um cigarro como se quisesse afastar o peso da notícia. - A policia deu alguma do motivo aparente?
- Roubo! O que mais? A gente devia comprar uma tranca nova pra porta... me arranja um cigarro? - Paul estendeu a mão para seu irmão mais velho.
-Talvez, más nesse mato tem cachorro. - Peter entregou o cigarro e deu uma olhada pela janela tentando ver alguma coisa anormal do lado de fora. - Que horas são agora?
Paul olhou o relógio, enquanto o irmão via pela janela o trânsito e as pessoas apressadas que caminhavam pela Rua Rector dirigindo-se para a ponte do Brooklyn:
- São vinte pras seis. Aliás, acho que vou comer, que já tá quase na hora de eu ir trabalhar.
- Preciso ir também, alguém me ligou ontem?
- Não. Acho que não. - Paul levantou-se tragando e foi para a cozinha, sendo seguido por Peter. - Esperando algum telefonema?
- -Sim, um colega que trabalha numa empresa em Manhattan ficou de me ligar a respeito de uma vaga. Acho que você o conheceu, lembra do Edward? Então, é ele.
Peter abriu a geladeira para ver o que havia para comer. Ele olhou para a garrafa de leite pela metade e o pote com um picles solitário boiando, além de uma maçã tão ressecada que parecia fossilizada. Paul respondeu-lhe, enquanto colocava um pouco de cereais numa tigela:
- Edward? Aquele com cara de nerd? Tem leite?
- Sim, ele mesmo. - Peter pegou a garrafa de leite e botou sobre a mesa. - E como tá o seu emprego? - Ele enfiou a mão no pacote de cereal e pegando o último punhado que restava.
- Tá bom.. - Paul mastigava  entre as palavras. - Meio paradão essa história de vigia... de shopping. Grana fácil... pouco serviço, só o horário que não é bom né...
Enquanto mastigava calmamente, Peter repreendeu o irmão:
- Paul, já disse para você comer devagar, vai acabar engasgando. Até que horas você vai ficar no trabalho? Estava pensando em ir tomar algo mais tarde se vc pagar, é claro - e ele riu.
- Ah  irmãozinho.. só volto de manhã, entro às 18:30 e saio à três e meia... aliás deixa eu ir me vestir. Se estiver em casa a gente pode fazer algo, mas sabe que a grana tá curta.
Paul se levantou e colocou a tigela na pia já um tanto cheia de louça suja. Peter fez o mesmo:
- Bem, acho que vou dar uma saída pra tomar um ar, depois de lavar a louça - e ele riu novamente. - Paul, vê se toma cuidado por ai cara, esse incidente com o Smith é de se preocupar, fica esperto. - Peter abriu a torneira e começou a lavar a louça.
- E eles iam roubar o que? Só se forem minhas dividas? - Paul disse saindo e rindo para a sala, dali para o quarto.
Quando Peter já lavava o quarto prato, viu o irmão passar já com o uniforme de segurança:
- Tô indo. Qualquer coisa liga lá no shopping, o número tá do lado do telefone.
- Beleza, qualquer coisa eu ligo, eu vou sair daqui a pouco também, se cuida.
Peter terminou de lavar a louça após mais alguns minutos, deixando os pratos no escorredor e se dirigiu para o quarto, onde também pretendia trocar de roupa. Ele estava vestindo a calça jeans, quando ouviu a porta de frente sendo forçada e abrindo. Rapidamente, ele colocou a calça, procurou algo que pudesse usar como arma, apagou a luz do quarto e se esforçou para ver se via quem estava adentrando. Olhou cautelosamente pela fresta da porta e viu dois sujeitos se esgueirando porta adentro. Ele alcançou seu taco de beisebol embaixo da cama, pensando sobre o que faria, ele não vira se eles estavam armados, mas eles não pareciam tê-lo visto também. Peter pensou em se esconder e olhou em volta de seu quarto. Havia o armário embutido na parede direita, à sua frente sua cama e depois dela a janela com as cortinas. Havia, ainda, o espaço atrás da porta que dava para o corredor e enfim para a sala. Ele ouvia os sujeitos se movendo pela sala. Resolveu então sair pela janela e se esgueirar. Foi justamente quando ouviu a porta do quarto ser aberta.
- Malditos, o que será que procuram? - Ele pensou, tenso e avançou agachado, temendo que o bandido tivesse uma arma.
Peter engatinhou até a quina da casa, permitindo-lhe olhar o movimento de fronte ao seu lar, agachado ao lado da cerca que divide o terreno da casa ao lado. Ele via as pessoas que circulam pela calçada alguns metros à frente da casa e os carros que circulam com intensidade, tomando o rumo de suas moradias, vindos de Manhattan, de seus trabalhos. Havia um carro estacionado na pista, a porta do passageiro aberta e apenas um motorista dentro dele. Enfim, Peter viu um homem vindo da casa em direção ao carro, ele carregava seu televisor nos braços. O carro era um Ford Custom 1957, mas a placa não era visível, ele teria de se aproximar e poderia ser visto. O homem depositou a televisão no banco de trás, enquanto Peter podia ver um segundo homem vindo de dentro da casa carregando o rádio em uma mão e uma pequena caixa de papelão na outra.
O primeiro homem, que carregou a tv, entrou no Custom azul e sentou-se ao lado da tv, recebendo em seguida do segundo homem o rádio e a caixa. Este baixou o banco do passageiro e sentou-se ao lado do motorista, sem que Peter os reconhecesse, mas tendo gravado seus rostos com precisão, com exceção do motorista, que deu a partida e arrancou dali.
Peter correu para dentro, passou pela porta arrombada e foi até o telefone. Tudo parecia nos conformes, exceto pela tv e pelo rádio que faltavam. Olhando em volta viu que algumas outras pequenas coisas estão faltando, como os cristais da mesa que sua mãe deixara, alguns porta-retratos.
- Delegacia de polícia, Susan falando. Boa noite, em que posso ajudar?



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