Carmem, que estava com tudo encaminhado para o café de Garcia, preferiu subir e entregar a refeição a Garcia. Desceria mais tarde, quando Esteban a chamasse. “ Que será que o delegado queria?” Ela pensou, mas resolveu descobrir depois. Entrou no quarto, cuja porta ficara aberta, e viu Garcia que esbanjou um sorriso quando a viu com a bandeja do maravilhoso café da manhã. Simples, porém apetitoso.
Fazendo um pequeno esforço para se erguer um pouco, como se fosse sentar, Garcia Contreras apenas se contorceu em caretas, deixando Carmem preocupada, mas logo abriu um sorriso:
- Sinto-me um sultão que recebe um banquete da mais bela das odaliscas...
Ela sorriu e logo em seguida lhe serviu, lhe dando as torradas, o chá:
- Quanto açúcar você gostaria?
- Duas colheres me bastam... Mas diga-me, minha prestativa dama, como findou o casamento? - Ele disse entre um gole de chá e uma torrada. - Espero não ter impedido a festa de continuar com minhas chagas.
-Ah, senhor Garcia, não posso lhe dar essa informação. Pra lhe ser franca, acabei passando todo o tempo no hospital. Ajudei o doutor Hurtado com alguns doentes, o hospital estava muito cheio, entende... Acabei fazendo o que podia por quem estava lá. Acabei esquecendo totalmente do casamento...
- Parece que não há infortúnio que a detenha... - Ele deu um sorriso simpático, entre uma torrada e o chá, enquanto já começavam a ouvir os passos vindo em direção ao quarto, quando por fim, o pigarreio de Esteban clamou por atenção do outro lado da porta.
- Com licença, senhorita Carmem...
-Sim Esteban, creio que sei do que se trata, já estou descendo. Senhor Garcia, se puder esperar, em um momento estarei aqui, o delegado está lá embaixo na porta. Creio que seja bom eu ir atendê-lo.
- Pois diga a ele que tome o mínimo de sua atenção, pois não sei mais ficar sem minha enfermeira... - Garcia deu seu mais belo sorriso desde que acordara do tiro.
Carmem estremeceu. Não sabia se sorria ou se saía correndo. Estava definitivamente sentindo algo novo e era por ele. Por aquele sorriso, por aqueles olhos...
-Ah, senhor Garcia, eu... Bem... Bem... Hãm... Eu não vou me, me, me... Demorar. - Ela sorriu sem jeito e saiu rapidamente.
Enquanto ela saiu experimentando aquela sensação que bailava entre o estremecer das pernas e saltitar serelepe, já podia ver Esteban descendo vagaroso a escada. Quando chegou até esta, vendo a porta da sala aberta e o delegado logo ali, quase dentro e Esteban que falava:
- A senhorita Carmem já vem...
- Sim. Estou vendo ela. Você pode ir. - Disse o delegado em tom desdenhoso, enquanto com o polegar e o indicador alisava o bigode. Fez uma reverência. - Bons dias, senhorita Rubio.
-Bom dia, senhor delegado. A que devo a honra de sua visita? Afinal como deves saber, minha família se encontra toda na fazenda por enquanto.
- Sim, eu soube. - Ele disse com um sorriso nervoso. - Mas pensei... Errr... A senhorita aqui, sozinha... Esses bandoleiros por aí à solta e vim... Vim oferecer minha proteção... Levá-la até a fazenda. Parece-me que a proteção de um homem viria bem, não? - O delegado disse agora com um sorriso como dos canastrões dos filmes sem cor que vez ou outra eram exibidos na praça da cidade. - Seria um enorme prazer de minha parte...
Mas Carmem o interrompeu:
- Olha delegado, é mesmo muita bondade a sua vir oferecer sua... Sua... Proteção. Mas bem, tenho os melhores capangas de meu falecido pai aqui. E em breve meu irmão chegará. Não há motivos para preocupações. De qualquer forma, agradeço. - Ela sorriu rápido. Queria sair dali e subir as escadas, para ver Garcia e sua voz tão encantadora. - Carmem pare de pensar nisso, ele é seu paciente! - Ela repetia inutilmente em sua mente. - Esteban, por favor, nem se afaste... - Ela chamou rapidamente em um tom alto, antes que o rapaz sumisse por completo. - Por favor, acho que pode acompanhar o nosso amigável delegado, que sempre é tão gentil e caridoso. - Ela deu um belo sorriso de despedida para o homem da lei, tendo absoluta certeza de que ele sairia dali logo para que ela pudesse ver o seu tão amado... "Amado, Carmem? Você não tem amado algum!". Enfim, para que pudesse ver Garcia, que no andar superior a aguardava.
Esteban veio andando, pronto a acompanhar o delegado, que no entanto se deteve por um instante, ainda olhando-a com aqueles olhos interessados.
- Vejo que está realmente bem protegida, senhorita Carmem. Espero, então, quem sabe, poder ter o prazer de uma conversa e um café com a senhorita, uma outra hora, quando tudo estiver mais calmo...
Carmem, um tanto intrigada com aquela situação apenas sorriu e acenou com a cabeça depressa:
- Qualquer outra hora, delegado, obrigada pela preocupação.
Então, ela subiu rapidamente as escadas, sem olhar o velho e chato delegado novamente. Passou o mais rápido que podia pelo corredor. Queria chegar logo àquele quarto, não encontrava uma explicação lógica... Apenas precisava ver o tão terno e gentil senhor Garcia, com aquele belo sorriso e também um corpo extremamente atraente, ela descobrira a pouco. Se sentia às vezes ridícula de pensar aquelas coisas. Para ela, tudo deveria ser apenas preocupação. Nem o conhecia direito, mas havia se interessado por Garcia mais do que esperava. Adentrou o quarto sorrindo, como se dissesse para Garcia em segredo que tinha consigo algo muito importante. De fato, conseguira. Afastara aquele velho intrometido dali o mais rápido que pode.
Chegando ao quarto, deparou-se com Garcia a olhá-la entrar. Estava lá, com os olhos na porta a esperá-la voltar. O sorriso brotou e se expandiu no rosto dele como se ela fosse um sol a livrá-lo da escuridão. Ao lado dele estava a bandeja vazia.
- Vejo que o bom delegado não me privou mais do que deveria de meu remédio...
Carmem sabia perfeitamente do que Garcia falava, porém resolveu se fazer de desentendida.
- Remédio, senhor Garcia? Está a sentir dor? Precisa que eu vá buscar algo?
- Refiro-me à sua presença, minha cara Carmem, sem a qual a dor me aflinge muito mais do que por conta desse tiro. Mas diga-me... O que desejava o delegado?
Carmem corou levemente.
- Ah, nada demais. Apenas se oferecer para guardar a casa, pois acabou sabendo que eu estava aqui sozinha,..
- Muito gentil ele. Parece que ninguém resiste ao seu charme, minha cara... - Ele riu bastante, mas logo parou por uma pontada de dor.
-Senhor Garcia, tudo bem? - Carmem preocupou-se e se aproximou muito, chegando perto do rosto dele.
O gemido se interrompeu e a mão dele seguiu até o ombro dela, enquanto os olhares se encontraram. Estavam a poucos dedos de distância um do outro e Carmem sentiu o calor da respiração de Garcia Contreras. Os lábios deles se esticaram num sorriso e parecia nunca ter havido dor naquele rosto.
- Acho que não posso me exceder... - Ele disse antes de beijá-la.
Carmem não conseguiu sequer pensar. Garcia estava muito perto e ela não sabia o que dizer ou como sair da situação ou se deixava se levar pelo momento. Carmem se perdeu naqueles olhos, naquele sorriso, mas não fazia a menor ideia do que realmente se daria. Estava em transe, praticamente hipnotizada por aquilo tudo.
O toque dos lábios foi como um mergulho refrescante num rio. Veio o sabor adorável do toque dos lábios, que chegavam alimentados pela volúpia da paixão. Os lábios se fizeram ávidos e desejosos, sedentos do encontro. Assim como águas geladas, no entanto, faziam irradiar por todo o corpo os calafrios que despertam e revigoram.
Os corações dispararam nos peitos como se ali não mais coubessem e o ar parecia escorregar furtivamente das narinas, deixando-os arfantes. Era simplesmente mágico. Fez o tempo parecer parar.
- Arrã... Parece que estou interrompendo algo... - Veio subitamente uma voz da porta.
Em seu íntimo, Carmem sentiu que aquilo não podia ser verdade. Ela estava ali, beijando Garcia e aquela típica voz a interrompeu, aquela voz conhecida que não deveria ter ouvido naquele instante. Quantas perguntas ele poderia ter feito a Garcia, quanto tempo não a perturbaria e a chamaria de desonrada por conta de um beijo? Não, ele não sabia que aquilo foi muito mais que um beijo, que era mágico, maravilhoso, que Garcia era o homem que vinha no cavalo nos sonhos de criança de Carmem. "Mas na verdade quem o salvou fui eu...". Ela pensou achando aquilo engraçado, mas percebendo que precisava desgrudar os lábios de Garcia,
Ela se separou dele sorrindo, afinal não haveria mais o que fazer mesmo.
- Álvaro, você adora aparecer nos meus melhores momentos, não? - Perguntou Carmem com tom debochado, afinal sabia que teria de enfrentar longa briga com o irmão.
- Parece que você não tem consciência do seus atos, irmãzinha! - Álvaro disse aquilo nitidamente irritado e num tom bastante áspero. - E você, Garcia, achava que estava convalescente e está aí a se aproveitar dela! Não fosse seu estado, ensinaria-te uma lição!
Carlos levou a mão até o ombro de Álvaro:
- Acalme-se homem, não há nada de mal...
- Posso lhe garantir que minhas intenções para com sua irmã são as melhores Álvaro. Eu a amo.
Carmem corou ligeiramente e olhou para Garcia:
- O q-que di-di-disse se-senhor Ga-Ga-Garcia?
- É isso mesmo, minha salvadora. Essa experiência quase mortal serviu para abrir meus olhos para a verdade. E a verdade é que eu a amo.
- Pois abusar da inocência de uma jovem dama não..
- Ora Álvaro, cale-se por favor. Não sabe respeitar um convalescente e dois apaixonados... - Interrompeu Carlos com bom humor, tomando a frente de Álvaro que parecia agora mais aturdido do que bravo.
O sorriso no rosto de Carlos fazia Carmem se sentir ainda mais confusa. Seu irmão não parecia tão irritado. Ele havia ficado muito mais na vez em que ela era dama do casamento dele e havia se atrasado simplesmente porque estava lendo. Seu irmão lhe lembrava muito seu pai. De repente lembrou de como a mãe sempre insistia que um dia ela precisaria arrumar um bom partido, um namorado. E pensou que com certeza sua mãe, se estivesse no lugar de Alvaro se sentiria extremamente feliz. Mas acima disso, Garcia disse que a amava. Duas vezes. Devia haver algo errado por ali. Um dos moços mais belos que ela já havia conhecido lhe dera um beijo doce, e depois disse para o seu irmão que a amava. Mas ela havia salvo sua vida, isso não seria apenas gratidão?
Pensava em tantas coisas ao mesmo tempo que teve impressão que sua cabeça iria explodir. Será que ela conseguia falar? Iria tentar, afinal Álvaro já tinha visto a cena que pra ele devia ter sido extremamente desagradável, porém para ela...
- Obrigada, Carlos. Álvaro, você não tem nada a ver com isso está bem? E eu não sou uma jovem inocente. E muito menos o senhor Garcia abusou de mim. - Ela encarou Garcia finalmente, pôde encontrar aquilo que lhe daria forças para enfrentar qualquer perigo deste mundo, o sorriso dele. Continuou falando, mas olhando ainda para ele. - Eu amo Garcia, e não é você Álvaro que vai me impedir de algo que eu queira. - Só então virou se para seu irmão mais velho. - E que eu saiba, nossa mãe vai adorar receber uma notícia como essa, não é mesmo?
Carmem sorriu olhando para Carlos. Talvez se ele não estivesse ali junto de seu irmão, Álvaro não exitaria em lhe dar umas boas palmadas, como se estivesse batendo em uma criança de cinco anos.
- Ora sua inso... - Começou Álvaro, sendo contido por Carlos, que ainda sorrindo, enquanto o segurava falou:
- Pois eu fico deveras satisfeito por vocês dois, meus caros. Será ótimo tê-lo na família Garcia...
- Você não imagina como eu estou feliz, Carlos... Meu amigo... - Garcia disse ainda perdido num sorriso largo, enquanto olhava para Carmem. - Pois a prima de sua mulher roubou-me o coração, não posso negar.
- Vocês estão loucos! - Bradou Álvaro. - Você mal conhece esse sujeito!!!
- Ofende-me, senhor Álvaro, pois repito que amo sua irmã e não me tome por um mal sujeito. Meu debilitado coração talvez só bata por causa dela e penso ter sido esse amor o que me deu forças para sobreviver... Entendo seu alarde ante a cena que presenciou...
- Você estava a beijá-la!!!
- Ora Álvaro, contenha-se. Não somos mais meninos e sua irmã não é uma criança. É sim uma bela moça, ciente de seus atos...
Álvaro olhava tudo, parou de resistir e Carlos o deixou, enquanto Garcia Contreras estendeu o braço na direção de Carmem.
- O que me diz, minha amada Carmem, aceitas meu amor? Permitirás que eu te cuide pelo resto da vida como cuidas de mim?
Carmem não podia conter um enorme sorriso no rosto e um brilho gigantesco no olhar. Ela passou a realmente considerar a hipótese de que estaria sonhando. E bem, se não estivesse, queria lembrar de agradecer a Carlos pelo resto de sua vida.
- Garcia, como eu poderia lhe negar a coisa que eu mais desejo no mundo? Mas antes de dizer qualquer coisa, preciso que minha mãe aceite isso também. Afinal ela é minha mãe... - Ela olhou para Álvaro como se quisesse dizer que ele não era a sua mãe. - E gostaria de saber se meu irmão vai se opor a isso. Afinal, quero saber quem quer a minha felicidade de verdade.
Continuou olhando para o irmão com o olhar mais determinado que conseguia, aquele que desde que ela se conhecia por gente fazia pra conseguir algo do irmão. Com o seu pai não costumava dar certo, mas Álvaro sedia e não lhe negava nada sempre que ela fazia sua chantagem emocional. Depois voltou-se para o amado. - Mas o que importa de verdade Garcia é que sinto que não quero me afastar de você nunca.
Continuou olhando para o irmão com o olhar mais determinado que conseguia, aquele que desde que ela se conhecia por gente fazia pra conseguir algo do irmão. Com o seu pai não costumava dar certo, mas Álvaro sedia e não lhe negava nada sempre que ela fazia sua chantagem emocional. Depois voltou-se para o amado. - Mas o que importa de verdade Garcia é que sinto que não quero me afastar de você nunca.
Garcia sorria, Carlos também, apenas Álvaro não parecia animado e resmungava:
- Ora... Isso... Vocês... - Por fim, ele virou-se e deixou o quarto, parecendo tentar escapar daquela situação que tanto o constrangia.
- Acalmem-se... Irei conversar com Álvaro. Certamente ninguém se oporá a união de dois apaixonados.
- Carlos, meu amigo. Agradeço a você por tudo... E aproveitando, desculpe o trabalho...
- Ora, meu velho, agradeça apenas a Carmem, que não separou-se um segundo de você... Além de arrancar a bala de dentro de você...
- Ela tem todo meu amor.. - Garcia disse enquanto a mão dele encontrou a dela num carinho delicado.
- Álvaro é temperamental. Carmem o sabe. Mas entenderá. E tenho certeza que sua mãe e seu tio, meu sogro, adorarão a notícia... Aliás, falando neles, devemos tornar para a fazenda, trouxemos uma carroça para levá-lo, caro amigo... A festa nos aguarda e agora há ainda mais motivos para celebrarmos. - Carlos passou o braço pelo ombro de Carmem e deu um tapinha no braço estendido de Garcia.
Carmem sentiu-se mais aliviada, afinal Álvaro tirara a tensão ao sair.
- Realmente, eu ia perguntar a você, Carlos, como acabou o casamento. Me perdoem, mas eu não poderia ficar lá, não é? - Ela sorriu para Garcia indicando que a "culpa" era toda dele. - De qualquer forma, vamos logo para a fazenda, afinal de contas perdemos comemorações demais. Não que eu goste muito de festas, mas digamos que eu tenha um ótimo motivo pra me animar para qualquer ocasião.
Falando isso, ela levantou-se da cama e informou que procuraria alguma de suas roupas que estivesse em bom estado para chegar a festa. Quando Carlos ia saindo, Carmem o chamou:
- Carlos, por favor, você não poderia... Sabe... Bem... Colocar uma roupa do Álvaro em Garcia? Afinal ele está meio fraco ainda, mas creio que não é necessário chegar com a roupa nesse estado...
- Claro, Carmem. Vá vestir-se. Eu, Álvaro, Esteban e Juan cuidaremos de vesti-lo e pô-lo na carroça. Só peço que não demore, pois o calor lá fora está intenso.
- Obrigada Carlos.
Carmem saiu apressadamente procurando qualquer vestido que fosse. Enfim, encontrou um vestido verde claro, florido nas bordas das alças e que ia um pouco abaixo do joelho. Prendeu os cabelos em um coque e lavou o rosto novamente. Em pouquíssimo tempo estava pronta. Quando deixou o banheiro, viu seu irmão, Carlos e os capatazes descendo Garcia numa padiola improvisada feita com um lençol. Logo estavam todos lá fora, buscando acomodar Garcia da melhor maneira.
Juan e Esteban ficaram cuidando da casa, enquanto os demais partiram no ritmo molejado da carroça, cujas rodas gemiam, enquanto era puxadas pelos dois cavalos. Ela era descoberta, expondo-os ao sol.
Álvaro guiava, enquanto Carlos ia sentado ao lado dele. O irmão da moça não havia falado mais nada desde que deixara o quarto, enquanto Carlos fazia comentários sobre o casamento e a festa todo o tempo para amenizar o clima. Carmem ia na parte de trás sentada, com Garcia deitado sobre seu colo. O rosto dele, feliz como o de uma criança diante de um mar de chocolate, fitava-a todo o tempo adornado por um sorriso singelo e sonhador, embora ele ainda estivesse pálido. Mesmo assim, o terno poido que ele vestia já melhorara bastante a imagem dele, escondendo os curativos e o sangue.
- Nossa Carlos, que bom que tudo deu certo, não é? Espero que ainda peguem aqueles homens horríveis.
Carmem ia conversando animada com Carlos e já brincava que ele seria padrinho do casamento dela. Enquanto conversava com Carlos, de vez em quando olhava para Garcia e sorria para ele, enquanto passava as delicadas mãos nos cabelos dele.
- Eles serão pegos, Carmem. Ninguém mexe com seu tio, se bem se lembra, afinal Don Fernandez Rubio é dos fazendeiros mais influentes de todo o México. Precisa ver como a fazenda está segura... Há guardas e soldados por todos os lados, além dos capatazes de seu tio. Queriam até mesmo mandar alguns para nos acompanhar, mas disse que Juan já estava de bom tamanho... Seu tio está uma fera com tudo. Imagine ter o casamento da filha invadido e convidados feridos... É um ultraje que ele não parece estar digerindo bem. Ainda bem que há a festa...
Carlos seguiu falando da lisonje por ter a honra de apadrinhar um casamento tão promissor, além de relembrar algumas histórias da antiga amizade entre ele e Garcia. Apenas Álvaro seguia calado, apenas soltando algumas reclamações esporadicamente ao longo da estrada até a fazenda.
A cidade logo foi ficando para trás, enquanto Carmem, fazendo uso de uma sombrinha, evitava o sol excessivo sobre seu recém-futuro marido. A carroça seguia o embalo do andar dos cavalos, apenas sacolejando quando uma pedra maior se apresentava na estrada.
- De qualquer forma, esses criminosos hão de pagar... Dizem que estão ligados a essas milícias que agem por todo sul, os tais ligados ao tal Zapata...
- Estamos chegando! - Interrompeu Álvaro, quando enfim a porteira da fazenda, que ainda distava um tanto da sede, irrompeu após um leve morro. Já haviam ali, além dos dois costumeiros capangas, quatro guardas da polícia.
-É, Carlos, vejo que não exagerou nem um pouco mesmo. Em todo caso, a segurança reforçada não é assim tão ruim. - Então, Carmem cochichou para apenas Carlos ouvir. - Pense bem, pelo menos assim Álvaro não poderá me deixar viúva antes mesmo de me casar... - E ela e Carlos ficaram a rir e fazer os comentários mais maldosos que conseguiam na tentativa de fazer Álvaro se soltar um pouco mais.
Os guardas fizeram sinal para que parassem, mas logo reconheceram Álvaro, que ao contrário dos demais, gargalhantes, estava bastante sisudo.
- Senhor Álvaro... Don Fernandez já havia perguntado se haviam voltado..
- Demoramo-nos um pouco além do esperado, soldado.
- E está vivo o seu amigo, senhor Carlos?
- Está aqui e bem soldado, mas creio que sendo esperados devamos seguir. - Disse Carlos enquanto os capatazes abriam a porteira.
- Não fosse o dolorido, caro amigo. - Falou Garcia Contreras para Carlos, ainda olhando para Carmem. - E eu diria estar no céu.
-Claro, Garcia, e Álvaro seria São Pedro? - Carmem falou num tom irônico que fez os três soltarem grandes gargalhadas. Ela até pode perceber um leve sorriso nos lábios de Alvaro, mas claro, nada que ele não pudesse disfarçar. - Nossa, estou faminta, parece que faz anos que não como.
- Verá como será belo o banquete do almoço, Carmem.. - Carlos falava enquanto ela escutava o próprio estômago roncar, assim como Garcia, deitado tão próximo a ele.
Desceram pela estrada de terra, avistando os bois que pastavam por trás das cercas. A grande sede da fazenda foi assomando diante de vocês e logo já escutavam a balburdia das festividades. Viam muita gente circulando, principalmente os empregados a cuidar dos preparativos para o almoço.
Havia uma grande mesa do lado de fora da casa. Seria capaz de receber cem pessoas, você imaginou ao vê-la, as criadas colocavam pratos e talheres sobre ela.
O tio de Carmem, Don Fernandez, olhava a tudo da sacada do quarto dele no segundo andar junto à esposa Amanda. A mãe de Álvaro e Carmem, a senhora Mercedez, ajudava a por a mesa, assim como a irmã deles, Valência, ajeitando os arranjos de flores e distribuindo a prataria. Magnólia, esposa de Álvaro, e Constanza, agora já esposa de Carlos, já avistando-os vinham andando em direção à carroça, assim como o pequeno irmão caçula Pablo, juntamente com outro meninos e meninas, que corriam serelepes em busca da novidade que se aproximava. Carlos acenava e gritava:
- Ele está bem. Aliás muito bem... - Falou ainda gargalhando um pouco.
A mãe de Carmem, ao perceber a tão esperada chegada da filha, também se encaminhou para lá. Ela percebia que Álvaro não estava com boa cara. Enquanto Carmem sorria para a mãe, percorria os olhos pelo lugar. Estava tudo realmente ótimo, apesar da melhor de todas as coisas estar deitada ao colo dela. Era isso o que fazia Carmem pensar que não havia mais nada de errado com o mundo. Carlos sempre estava fazendo uma piada ou outra, mas sabia que no fundo ele tinha gostado da notícia, era um bom rapaz o marido de sua prima. Estava tudo muito perfeito até Carmem avistar um certo convidado, que com certeza ela preferia que tivesse ficado na cidade cuidando de seus afazeres. Afinal aquele velho não devia ter sido convidado.
- Por que o titio não pode ter companhias melhores? - Ela pensou contrariada.
Pablo e seus pequenos companheiros foram os primeiros a chegar até a carroça, que no entanto só interrompeu seu movimento quando chegaram Constanza e Magnólia:
- Que bom que já voltaram, temi que se atrasassem para o almoço... - Disse Constanza já recebendo o sorridente Carlos que saltava da carroça.
- Carmem. Carmem. Você está bem? - Perguntou eufórico e esbaforido Pablito. - É verdade que você arrancou a bala de dentro dele?
A mãe da moça vinha se aproximando segurando o longo vestido pelas laterais, com o ar preocupado de sempre, embora seus olhos estivessem fixos em outra pessoa. Garcia fez um leve esforço para se levantar, enquanto Álvaro, entregando as rédeas a um criado, descia da carroça junto a Magnólia, dizendo:
- Você não vai acreditar...
- Nunca me atrasaria para o almoço do nosso casamento, meu amor... Respondeu Carlos. - Como vê, o senhor Contreras estava melhor do que pensávamos...
- Carmem gostava brincar de enfermeira... - Disse Constanza abrindo um largo sorriso.
- Querida prima, sinto lhe dizer que antes fosse uma brincadeira! Não sabes das coisas horríveis que as pessoas passam em hospitais... Poucos médicos, poucos lugares, mas enfim, pelo menos um paciente eu sei que está bem a salvo, não é Garcia? - Falou e sorriu diretamente para Garcia. Constanza logo notou que havia algo mais que um homem que tinha sido salvo por ela por ali.
- Sua prima é um anjo que salvou-me a vida, Constanza...
- É o que parece, senhor Contreras... Sente-se bem?
- Ainda não posso saltitar por aí, mas já estou bem melhor, obrigado. Uma cama é tudo que preciso... e da companhia de minha enfermeira, é claro... - Garcia disse acariciando as costas de sua mão com a dele.
- Caaaarmem!!! - Gritou Pablo zangado por ser ignorado, enquanto os outros meninos falavam todos ao mesmo tempo. A mãe que enfim chegara, apartou os meninos dali.
- Minha menina, como está? Vejo que seu amigo está melhor... Sou a mãe de Carmem, senhor Contreras...
- Então já sei de onde ela herdou tamanha beleza, minha senhora.
- Aguarde aqui, Garcia, vou buscar ajuda para levá-lo para dentro. Venha querida, venha Álvaro. - Disse Carlos tirando-os dali.
Carmem percebeu um sorriso nos lábios de sua mãe e pensou:
- Claro, ela sempre quis isso não é... - E então falou. - Mamãe, eu preciso lhe contar uma coisa e preciso saber se... Bem... Se a senhora me dá sua benção...
- E o que seria, minha filha? - Disse Dona Mercedez ainda sorridente e com um brilho no olhar, mas antes que Carmem falasse, Garcia interrompeu-a tocando-lhe a mão.
- Peço que me permita o prazer deste pedido, meu anjo...
Carmem sorriu para a mãe e apertou forte na mão de Garcia, virando-se para ele:
- Está certo, querido, tudo bem... - Ela percebeu que a mãe sorriu ainda mais ouvindo as palavras da filha e vendo aquele pequeno gesto de mãos que para ela era um conforto. Carmem adorava estar junto de Garcia. Ele lhe inspirava uma confiança, que apenas seu pai lhe inspirara. Mas o fato enfim, era que Garcia estava ali, a seu lado, prestes a falar com a sua mãe. Por fim, a moça ajudou Garcia a se sentar, enquanto abraçava o torso dele, já que ainda fraco, ele tinha dificuldades para manter-se firme. A senhora Mercedez parecia ansiosa.
- Minha senhora, eu sei que nos conhecemos em meio a uma grande confusão e não teve tempo de conhecer minha família ou meus afazeres. No entanto, desde que cheguei a este lugar, talvez por acaso, talvez pela vontade de Deus, não consegui deixar de encantar-me pela beleza de Carmem. Os últimos acontecimentos me fizeram ver todo o amor que brotou em meu peito... - Garcia fez uma pequena pausa recuperando o ar, enquanto Carmem e sua mãe trocaram olhares animados e confidentes. - E eu não sei quanto a seu esposo...
- Está certo, querido, tudo bem... - Ela percebeu que a mãe sorriu ainda mais ouvindo as palavras da filha e vendo aquele pequeno gesto de mãos que para ela era um conforto. Carmem adorava estar junto de Garcia. Ele lhe inspirava uma confiança, que apenas seu pai lhe inspirara. Mas o fato enfim, era que Garcia estava ali, a seu lado, prestes a falar com a sua mãe. Por fim, a moça ajudou Garcia a se sentar, enquanto abraçava o torso dele, já que ainda fraco, ele tinha dificuldades para manter-se firme. A senhora Mercedez parecia ansiosa.
- Minha senhora, eu sei que nos conhecemos em meio a uma grande confusão e não teve tempo de conhecer minha família ou meus afazeres. No entanto, desde que cheguei a este lugar, talvez por acaso, talvez pela vontade de Deus, não consegui deixar de encantar-me pela beleza de Carmem. Os últimos acontecimentos me fizeram ver todo o amor que brotou em meu peito... - Garcia fez uma pequena pausa recuperando o ar, enquanto Carmem e sua mãe trocaram olhares animados e confidentes. - E eu não sei quanto a seu esposo...
- Meu marido está morto, senhor Garcia.
- Perdoe-me... Sinto muito... Então não há realmente ninguém mais apropriado do que a senhora, para que eu realize meu pedido...
- Pois diga-o, homem!
- A senhora daria-me a honra de conceder a mão de sua filha para que se case comigo?
Carmem resolveu falar algo também, tinha ficado impressionada com Garica, ele não a pediria em namoro ou noivado, nada disso, ele estava disposto a se casar. Casar com alguém que acabara de conhecer, parecia loucura! Mas se de fato uma loucura tudo isso fosse, seria a melhor loucura de sua vida, ela tinha certeza.
- Olha mamãe, talvez a senhora ache cedo, não sei, mas posso lhe garantir que Garcia é um bom homem e, mamãe, eu realmente quero muito ficar ao lado dele... O que a senhora acha? Quero dizer, bem, a senhora nos daria sua benção?
- Olha mamãe, talvez a senhora ache cedo, não sei, mas posso lhe garantir que Garcia é um bom homem e, mamãe, eu realmente quero muito ficar ao lado dele... O que a senhora acha? Quero dizer, bem, a senhora nos daria sua benção?
Dona Mercedez parecia um tanto surpresa, ainda que não conseguisse esconder a satisfação:
- Ao que me parece, senhor Contreras, vocês já estão de acordo. E, já deve ter percebido que não é esta velha e cansada mãe que concegue impedir essa garota de fazer alguma coisa quando ela põe isso na cabeça... - Ela começou a sorrir largamente e os olhos encheram de água. - Minha menina... Minha doce Carmem... Está pronta para virar uma mulher... Não imaginei que esse dia fosse ficar tão feliz depois do que aconteceu ontem... Queria tanto que seu pai estivesse aqui. Ele ficaria tão orgulhoso de você, querida... - A mãe abraçou a filha e também Garcia. - É claro que vocês tem minha permissão.
- Ao que me parece, senhor Contreras, vocês já estão de acordo. E, já deve ter percebido que não é esta velha e cansada mãe que concegue impedir essa garota de fazer alguma coisa quando ela põe isso na cabeça... - Ela começou a sorrir largamente e os olhos encheram de água. - Minha menina... Minha doce Carmem... Está pronta para virar uma mulher... Não imaginei que esse dia fosse ficar tão feliz depois do que aconteceu ontem... Queria tanto que seu pai estivesse aqui. Ele ficaria tão orgulhoso de você, querida... - A mãe abraçou a filha e também Garcia. - É claro que vocês tem minha permissão.
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